"Não imagine, porém, o afoito leitor, que irá encontrar um romance com tinturas revolucionárias, à la Jorge Amado (1912-2001), em que os miseráveis são idealizados à espera de um cavaleiro da esperança que os venha redimir. Aqui, os pobres são também humanos, retratados por um pseudoautor chamado de Poeta, que sabe bem que nada de grandioso se pode esperar da espécie humana, como já dizia o russo Fiódor Dostoiévski (1821-1881). Resignado com sua própria condição de proletário, o Poeta trabalha em “uma fábrica onde ninguém é companheiro de ninguém, e um quer mais é foder o outro”. Lá todos sabem que o mais esperto deles pôde chegar ao principal posto do governo da Nação, “comandando uma legião de Ph.Ds que sabiam menos que ele, governante maior, provando que escola boa é a da vida”. Operário com veleidades de escritor, o personagem principal, espécie de alter ego do autor, procura reproduzir o idioma português arrevesado e vulgar que se fala nas fábricas da região Sul do país. Porém não deixa de mostrar que é versado não só em clássicos nacionais, como Machado de Assis (1839-1908), mas também em autores icônicos das últimas gerações, como o português Fernando Pessoa (1888-1935) e o alemão-norte-americano Charles Bukowski (1920-1994). Cínico com sua própria condição de proletário (“que ganha sete pau”), o personagem-narrador não disfarça que se aproveita do horário de trabalho para bate-papos intermináveis pela internet ou para ouvir música brega ou, até mesmo, escrever este romance pós-moderno que surpreende por sua linguagem desabrida e desbocada, ainda que seja pretensamente a de um operário intelectualizado."